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Diligência em M&A, entrevista com Fábio Pires, Managing Director da Alvarez & Marsal no Brasil



 

Diligência em M&A, entrevista com Fábio Pires, Managing Director da Alvarez & Marsal no Brasil

Entrevista com Fábio Pires, Managing Director da Alvarez & Marsal no Brasil, responsável pela área de Transaction Advisory no Brasil e América Latina. Ele conversou conosco sobre o mercado de due diligence no Brasil e o crescimento da importância de se fazer o “sell side due diligence”. Veja os detalhes de nosso bate-papo:

 

Denis Morante – Fortezza Partners: Fábio, conte-nos de forma breve o que é uma diligência do ponto de vista da Alvarez & Marsal, considerando os aspectos que vocês analisam usualmente.

Fábio Pires – Alvarez & Marsal: De forma bem sucinta, diligência para nós é uma análise robusta das demonstrações financeiras e contábeis, das obrigações tributárias, fiscais e trabalhistas de uma empresa sob uma ótica transacional envolvendo a compra ou a venda de um ativo ou de uma empresa. Diligência é uma análise feita ao redor desse contexto. Lembrando que o DNA da Alvarez & Marsal é muito operacional. E muitas vezes acabamos expandindo o nosso escopo para uma esfera operacional: desde uma ótica de compliance e TI até aspectos operacionais, comerciais, logísticos, etc.

 

DM: Diligências são normalmente feitas por compradores. Qual o objetivo deles e as principais preocupações que buscam cobrir, identificar durante a diligência?

FP: Geralmente os compradores buscam validar a tese de investimento. Testar todos os gatilhos de valorização do negócio, além de identificar os riscos e exposições. Lembrando que a grande maioria das transações está ancorada a uma valorização de EBITDA negociado no momento de pré-transação, cartas de intenções. Agora, validar esse EBITDA recorrente alem da conversão desse EBITDA para caixa são processos críticos para nós. Outros aspectos também são importantes: entender a qualidade dos ativos, mensurar os passivos da empresa, inclusive exposições tributárias, fiscais, trabalhistas e previdenciárias. Esse é o nosso dia a dia. Acho que o grande foco para nós e, que também faz parte da diligência, é buscar oportunidades. Trazer insights ao comprador/investidor quanto à performance do negócio, tendências de margem, concentração de clientes, problemas com fornecedores, níveis de capital de giro, níveis de endividamento etc., são partes do nosso dia a dia. Outro ponto de diligência que é importante trazer aqui é de avaliar e mensurar a qualidade da administração. Algo que nossos clientes estão sempre perguntando e ajudamos na avaliação da capacidade de administração de tocar o business na próxima fase, pós-transação. Quem são as pessoas, o que elas fazem, qual o modelo de gestão e a qualidade, ou seja, como isto traduz na qualidade da informação, dos controles e geração de caixa de forma sustentável.

 

DM: Apenas complementando essa pergunta, eu vejo muito no mercado falarem que quando começa uma diligência é o momento em que serão levantados todos os problemas. E não é bem isso. Vocês não procuram só por problemas. Quando vocês acham aspectos interessantes, positivos vocês também trazem à tona para o comprador, certo?

FP: Sem a menor dúvida. A nossa função é apontar para os nossos clientes oportunidades e é algo muito comum buscarmos créditos tributários previamente não identificados, tributações mais eficientes, melhorias de capital de giro ou dívidas que são extremamente caras, ou relacionamentos com fornecedores que geram um custo alto para a empresa, entre outros. Tudo isso é parte do nosso trabalho e que se traduz em uma modelagem financeira ajustada e que possibilidade uma negociação mais assertiva com os vendedores, gerando valor para o comprador, sem a menor dúvida.

 

DM: Há diligências feitas pelos próprios vendedores. Explique-nos as diferenças, motivações e funcionamento desse mercado que é o “sell side due diligence”?

FP: A gente adotou esse nome de “sell side due diligence” por estar do lado do vendedor, e do lado do assessor financeiro. É um tipo de diligência muito presente no mercado de M&A global. É obvio que os mercados que adotaram sell side due diligence foram primeiro o Reino Unido e EUA. Depois foi criando pernas para o resto do mundo. Mas, sem a menor dúvida, é outra pegada, é outro approach, e confesso que as motivações variam de transação para transação. De forma geral, nós fazemos o sell side due diligence no Brasil quando existe uma complexidade anormal em um processo de compra e venda de uma empresa. Vou dar alguns exemplos: temos visto muito no mercado brasileiro uma empresa vendendo uma unidade de negócio, ou uma subsidiária que não necessariamente é core no negócio de forma geral (aqui se enquadram carve outs), ou quando a contabilidade não necessariamente demonstra a realidade da empresa, ou quando se tem vários CNPJs, várias transações com empresas específicas, ou seja, a capacidade de um investidor de avaliar aquele ativo de uma forma independente é mais complexa. Lembrando que, diligência do ponto de vista do comprador inclui uma série de assessores, normalmente, os melhores dos melhores, avaliando a empresa no detalhe. Eu acho que o mínimo que um empresário que quer vender uma empresa deveria fazer é se preparar para o processo. A preparação do empresário é fundamental. Ele precisa se perguntar se está pronto para isso? Eu e você que estamos nesse mercado há tanto tempo sabemos como é desgastante um processo de M&A para um empresário.

Enfim, Prepare-se para isso! Acho que uma esse tipo de diligência sell side é a melhor preparação. Nós somos a tropa de choque, todas as perguntas tributárias, contábeis, fiscais, aquele detalhe do detalhe que se eu fiz o sell side, a pergunta vem primeiro para mim, para a minha equipe. Nós fazemos uma triagem, um filtro, e envolvemos os nossos clientes e o próprio assessor financeiro no momento certo, na hora certa, quando você tem um tema sensível, negocial. No entanto, posso dizer que 70%, às vezes até mais, do dia a dia de um processo de diligência fica com a gente. E isso tira um peso enorme do empresário vendedor durante o processo de M&A. E isso faz com que ele consiga tocar o dia a dia, e ter sanidade mental para quando chegar a hora de negociar o valor, ele estar menos desgastado e mais preparado para isso.

 

DM: Você trabalha com isto há muito tempo. Conte-nos como este mercado funciona fora do Brasil e no Brasil, a partir inclusive do seu histórico profissional nesta área.

FP: O mercado no Brasil evoluiu muito. Acho que vale um parênteses rápido sobre isso, pois o ambiente de diligência prestado por um contador é um ambiente regulado. Até 2012, os serviços de diligência eram enquadrados como um serviço de auditoria clássica, aqueles em que o contador emite um parecer. E isso era muito ruim para os prestadores de serviço que não estavam auditando empresas, e sim diligenciando. Afinal tudo que o consultor não estava fazendo era emitir um parecer sobre aquela empresa. No mercado europeu e americano já se formalizou o serviço de diligência com regulamentação e está separado do trabalho do contador que faz auditoria externa. E isso, o Brasil conseguimos fazer só em 2012, com a norma CT-08-2012, que separou o contexto de diligência de auditoria externa. Vale ressaltar que o serviço de diligência é um dos poucos serviços de natureza contábil que é contratado por um cliente e o escopo executado em uma empresa terceira. Isso foi um marco muito importante para a profissão no Brasil e podemos dizer tranquilamente que auditoria não é diligência no contexto técnico. O investidor internacional pode vir ao Brasil e ter segurança de que tem prestadores de serviços profissionais e que são regulados, inclusive que se enquadram no processo internacional de diligência e standards de consultoria. E isso é importante porque a gente vai se alinhando com o mercado internacional – e na Alvarez & Marsal esse é nosso dia a dia.

 

DM: Como está a evolução do sell side due diligence no Brasil?

FP: Posso dizer que há cinco anos eu contava nos dedos da mão quantos sell side eu fiz naquele ano. Eu confesso que a evolução de sell side no Brasil está um pouco mais devagar do que eu gostaria, mas certamente evoluiu muito. Vou dar um exemplo: hoje nos Estados Unidos, a Alvarez & Marsal faz em torno de mil diligências por ano. Nosso makeup deal, de buyside e sell side, é de 70% buy e 30% sell side naquele mercado. Tropicalizando para o Brasil, nós fazemos uma média de 100 diligências por ano. Nossa carteira é praticamente metade disso, mais ou menos, sendo 10% a 15% sell side. Lembrando que Reino Unido e Estados Unidos foram os primeiros países a introduzir sell side no mercado. Hoje, é raríssimo você entrar em uma transação de M&A sem ter sell side due diligence nos Estados Unidos e na Europa de forma geral. Lá fora, é muito comum você entrar em um processo e o comprador já vir perguntando onde está o relatório de sell side due diligence. Está no DNA, na cultura e está dentro do processo de M&A. Não tem como tirar mais. Agora, se você me perguntar vantagens e desvantagens, eu vejo inúmeras vantagens em fazer sell side. Isso te dá segurança de que as informações disponibilizadas ao comprador e aos seus assessores tem consistência, tem qualidade e devem sofrer pouca mudança durante a diligência do investidor. Tirar um pouco do elemento de surpresa com relação à qualidade da informação tem um valor muito grande para todas as partes do processo. Acho que sabendo que você está entrando em um processo de M&A como vendedor, tirando o elemento de que não sofreremos muitas mudanças com relação aos números, e tendo um assessor técnico de qualidade ao seu lado, é uma segurança muito importante para o empreendedor. Se a gente conseguir contar a história do negócio de uma forma organizada, ancorar números gerencias com as contábeis, a gente consegue ter mais segurança na transação e, por consequência, a chance de sucesso do fechamento é maior. Acho que tirar o acionista da tática da transação também, no meu ponto de vista, é importante. Você tirar ele de processos muito detalhados e que podem desgastá-lo, sendo que, vamos precisar dele para ter um ponto de vista são e sóbrio no momento certo e crucial da transação. Então evitamos que ele tenha qualquer tipo de stress desnecessário. Agora você vai falar: e tem desvantagem? Acho que o custo pode ser um fator. Para fazer sell side due diligence, com certeza, ele terá que colocar um pouco de dinheiro na frente, mas é o que falo para todos os advisors e todos os meus clientes que um ajuste de EBITDA que eu consigo defender, ele me pagou e pagou bem mais o que realmente custou. Eu vejo pouco downside em se fazer o sell side.

 

DM:  Quais são os grandes mercados compradores de diligência no Brasil? Se você pudesse dizer quais são os mais ativos, que mais constam da sua lista de clientes?

FP: Os principais compradores para a Alvarez & Marsal hoje são os investidores profissionais, os private equities, os fundos soberanos, os escritórios das famílias (family offices) que investem em empresas, além do mundo corporativo. Nosso portfólio, particularmente, tem um peso maior nos investidores profissionais. Hoje nosso makeup é 70% private equity e, sem a menor dúvida, esse é um mercado que globalmente tem um peso muito grande em M&A. E na Alvarez & Marsal, a tendência a casar bem com o fundo de private equity pelo nosso approach, de ser pró-deal, hands-on e ter agilidade. É um mercado que tende a crescer. Certamente os investidores vão ter uma presença muito grande no mercado de compra e venda, e no mercado de capitais de forma geral. Acho que essa evolução do mercado de M&A no Brasil é muito aparente, tende a crescer e, certamente passando essa pandemia e com a estabilização da economia, veremos bastante os corporativos e os investidores internacionais voltando.

 

DM: Você diria que qualquer empresa deveria fazer o sell side? Mesmo aquelas que se consideram “arrumadas”? Você acredita que o empresário deveria fazer só quando ele tem um processo ou é importante que ele tenha como visão de que isso é importante inclusive para melhorar a empresa?

FP: Eu sempre recomendo fazer o processo de sell side due diligence. Acho que você tem muitos benefícios quando consegue ter o ponto de vista de um terceiro sobre controles, geração de caixa recorrente, capital de giro, exposições tributárias, o que estamos vendo no mercado hoje em dia com relação a créditos, mudança de legislação, etc. Lembrando que estamos na ponta dos investidores profissionais que vivem disso. Recebemos muitos feedbacks dos clientes, que o valor agregado de um processo de sell side diligence vai muito além de um processo de M&A. Com todo respeito ao empresário, eu vejo muito isso: o entendimento do empresário sobre o negócio dele se aprofunda muito depois de um processo de diligência. Muitas vezes, o empresário está focado em mercados, vendas, estratégia e, às vezes, não tem tempo para olhar debaixo do capô. E eu recebo muito esse feedback, independente de fechar o negócio ou não, saímos de lá com um mapa do negócio mostrando as deficiências e, o mais importante, mostrando oportunidades de melhorias. A minha recomendação é sempre fazer sell side due diligence porque é um valor agregado muito grande.

 

DM: Fábio, ainda nesses casos de sell side, que tipo de benefícios você já ouviu dos próprios empresários?

FP: Eu já recebi alguns feedbacks que eu acho importante contextualizar pelo fato de que o processo de M&A não é um processo normal na vida de um empresário. Mais da metade das transações que a gente faz hoje no Brasil ainda são de empresas familiares. Empresas que estão na vida daquela família por muito tempo e que não necessariamente passaram por um processo de profissionalização.  O contexto de M&A, como já discutimos anteriormente, é extremamente desgastante. O processo de sell side due diligence tem um sentimento de parceria, um sentimento de que nós nos colocamos no sapato do empreendedor, do CEO, CFO. E, principalmente no mercado brasileiro, em que ainda encontramos terceirização de contabilidade, nós assumimos um papel muito robusto no processo de M&A. Eu sempre falo isso e, respeitando muito a profissão do contador terceirizado, que está lá fazendo a sua função, que ele é muito alongado em um processo de M&A. Em sell side due diligence acabamos assumindo uma função muito estratégica dentro da empresa, com um viés tático de conhecer cada detalhe, de pôr o nosso pé na frente para que possamos ser a tropa de choque de diligência frente ao comprador. O feedback é relativamente direto, é parceria, segurança de que temos conhecimento do business e que a gente pode navegar a diligência de pessoas sofisticadas e preparadas do outro lado. E que no final a gente consegue segurar a valorização do negócio, o que não necessariamente aconteceria sem o suporte técnico, contábil e tributário em uma diligência. O feedback de preservar valor e de parceria é muito forte nesses processos.

 

DM: Você está contando que trabalha muito em processo em que o private equity compra. Então queria juntar dois conceitos em uma pergunta: Você acha que também as empresas arrumadas, desenvolvidas, ou até uma empresa que um private equity comprou, você também acha que essas são alvo de diligência prévia e há valor agregado em fazer um sell side due diligence?

FP: Sim, e eu olho o mercado internacional sofisticado e vejo uma tendência óbvia. As empresas que estamos fazendo sell side due diligence nos Estados Unidos, por exemplo, são extremamente sofisticadas. Elas têm um ERP e uma administração profissional desde que nasceram. São investidas de um fundo de private equity faz anos e é raríssimo terem um processo de M&A sem um sell side due diligence. Lembrando que diligência não é auditoria. As informações contábeis e financeiras, precisam ser ajustadas para os fins de M&A. EBITDA não é um termo contábil. Você não vai encontrar o EBITDA validado pelo auditor externo em uma demonstração contábil auditada. Então negociações sobre o que entra em capital de giro, definição de dívida, gatilho de valorização e oportunidades, ou a própria avaliação da qualidade da administração e como tudo isso deve ser levado para valorização da empresa que não é uma auditoria clássica. As empresas ja arrumadas estão focados em administrar o negócio, mas não é o dia a dia deles comprar e vender empresas. E, por isso, eu digo que sell side due diligence, um bom advogado de M&A e um bom assessor financeiro é a receita de bolo perfeita para você ter um processo eficiente de M&A. Voltando a sua pergunta, sem dúvida nenhuma, tem que fazer!

 

DM: Você acredita que o mercado brasileiro tem potencial de migrar para o estágio dos mercados mais maduros?

FP: Eu vejo essa transição como praticamente inevitável. O mercado de M&A Brasil e Latam de forma geral é um mercado que vem evoluindo, vem crescendo e deve fazer parte da agenda das empresas de uma forma recorrente. Acho que empresa familiar ou empresa gerida por um private equity em algum momento de sua vida precisa pensar em adquirir uma empresa, vender uma unidade ou fazer uma fusão com uma outra. Será parte do dia a dia. E o mercado de M&A se profissionalizou e em momentos diferentes e mercados diferentes. Olhando para trás como o mercado evoluiu, sell side due diligence começou a pedido dos bancos juntos com os assessores financeiros que ligavam para nós falando que precisavam de sell side due diligence. Como você acabou de articular, você vai levar uma empresa para o mercado que tem um valor, mas que você tem necessidade de arrumação da casa, como dizem. Então começou por ai. Como está hoje o mercado? Nos EUA e Europa as empresas já estão ligando diretamente para a gente. Hoje os Bancos não necessitam tanto  fazer essa ponte porque já está no DNA dos empresários, dos fundos e dos investidores que sell side due diligence é necessário. No Brasil, os Bancos e assessores financeiras ainda são impressindiveis em promover sell side due diligence. Se eles não me ligarem, o empresario brasileiro não buscaria sell side.  Eu tenho certeza de que o mercado Brasileiro tem que migrar para esse estado mental, até porque a quantidade de transações que não fecham no Brasil é ainda alta, muito por conta da diligência. A diligência traz desafios, traz os problemas das empresas para a mesa e muitas vezes está despreparado para lidar com aquilo no contexto da transação. Então a gente precisa diminuir esse gap. Essa capacidade de fazer a transação fechar é parte também da nossa responsabilidade.  Eu adoraria estar em todos, mas nem sempre é possível. Acho que a função do assessor é relevante na qualidade da transação e de fechar a transação.

 

DM: Com relação ao futuro deste mercado, como a tecnologia tem impactado e continuará impactando a atividade? Se puder nos fazer uma retrospectiva desde a época dos data rooms presenciais em salas de hotéis de décadas atrás.

FP: A gente recebia uma ligação na sexta-feira, às 5 da tarde, falando que iria começar a transação na segunda-feira em um determinado hotel. E a gente chegava lá e tinham pastas na parede que a gente tinha que decifrar e montar as análises do zero. Era uma coisa absurda, uma loucura total. Balancetes impressos, pastas infinitas. Não sei se tenho saudades!

A tecnologia sem a menor dúvida veio para ficar. E inovação e tecnologia estão no nosso dia a dia. Acho que a mais óbvia para nós foi a entrada do data room virtual que mudou a nossa vida. Mas a digitalização de documentos, a migração dos negócios e a diversificação das empresas de tecnologia de ERP e a própria digitalização das obrigações tributárias no Brasil levou muita inovação e tecnologia ao mercado. Todas  as consultorias estão correndo atrás disso e estamos nos adequando a esse processo. Tenho alguns exemplos. No ano passado, a Alvarez & Marsal criou um fundo de investimento em startups no Brasil com foco em inovação e tecnologia. E por que isso? Porque acreditamos que temos que estar muito alinhados e em constante parceria com o ambiente de inovação. E essas tecnologias vão fazer parte do nosso DNA e, por consequência, dos nossos serviços e que vão fazer parte do trabalho que oferecemos para os nossos clientes. Estamos nos reinventando. E tem que ser assim e não tem jeito. Hoje nós abordamos diligência com muita tecnologia e não tinha como fugir disso. Ate pouco tempo fazíamos testes por amostragem. Hoje levamos RPA e inteligência artificial em software que nos permitem testar 100% das obrigações acessórias das empresas. Nossa diligência está mais robusta com a chegada da tecnologia de ponta. O conceito de materialidade é menos relevante nas nossas diligências pois conseguimos abordar mais processos e maior volume de transações das empresas com tecnologia. E do lado financeiro e contábil, em data analytics, nós acessamos os ERP das empresas digerir grande volumes de dados. E esse é um impacto para nós que veio para ficar. Estamos treinando nossa equipe para isso, principalmente o pessoal mais jovem que acabam virando mini cientistas de dados. Nosso pessoal tem uma capacidade analítica e um acesso às ferramentas muito vasto.

 

DM: Você acredita que este trabalho um dia poderia ser substituído por “máquinas”? Como a tecnologia pode impactar a atividade de diligência de uma maneira geral?

FP: É uma boa pergunta e eu confesso que nessa pandemia, eu te dou um exemplo direto, eu estava no Zoom com um cliente que estava prestes a assinar um cheque de 100 milhões de dólares. E ele olhou para mim e comentou que ninguém nessa vida vai fazer um cheque neste valor sem olhar na cara da pessoa, sem desenvolver um relacionamento com aquela pessoa. Eu acho que todos esses recursos de vídeo conferência são ótimos, fenomenal, estão agregando, e muito, e fazendo o processo eficiente e melhorando a qualidade da diligência e o processo de M&A. Mas o contato humano é muito importante no nosso negócio. Acho que a gente tem viajado menos, temos focado mais em análises e isso acho que melhora a qualidade de vida do nosso time, mas a gente ainda interage muito, o fator humano ainda é muito importante para nós. Nossos clientes já passaram para nós esse feeling de que precisa ter o contato humano. Ainda é preciso “andar no chão da fábrica”, conhecer o processo, saber como se faz. E os meus clientes a mesma coisa, sentar-se para negociar é muito humano. Eu vejo muito valor nesse processo, mas eu não vejo a substituição parcial ou completa. Continuo contratando, estamos crescendo muito e acho que continua dessa forma.

Tem um ponto interessante para se abordar: a gente faz diligências ao redor do mundo e o mercado brasileiro com relação ao mercado internacional, tem evoluído muito, mas existe ainda uma indisponibilidade de informações no Brasil. Se a tecnologia está lá, mas a informação não existe, criamos uma limitação muito forte ainda no nosso mercado. Nas empresas listadas que já tem um investimento em tecnologia por um tempo essa diligência está bastante interessante, a tecnologia usufrui e dá um show. Agora quando diligenciamos uma empresa média ou pequeno porte, ainda encontramos muita dificuldade de informação. Então o Brasil de forma geral precisa subir, investir em tecnologia. Nós estamos chegando com a tecnologia, mas o empresário precisa subir com a gente e usufruir.

 

DM: Como está a atividade da A&M no Brasil? Aproveite para nos descrever os impactos da pandemia sobre os seus negócios, como está e o que deve vir adiante.

FP: A Alvarez & Marsal tem usufruído de uma estratégia proativa de diversificação de serviços e investimentos em inovação. Nós nos diversificamos e criamos a área de assessoria em transações, corporate finance, infraestrutura e projetos de capitais, disputas e investigações, serviços no setor de saúde, assessoria tributária, além do core da firma que é restruturação e corporate transformation. Criamos uma série de áreas que trouxeram uma expertise muito grande para a firma. Nossa firma é reconhecida pela capacidade de trabalhar bem em ambientes complexos e não fugimos do ambiente de crise, pelo contrário, encaramos de frente. E sem a menor dúvida que a pandemia trouxe um elemento de stress muito forte ao mercado. Eu diria que nossa equipe de reestruturação continua muito muito atarefada no momento. Agora, para nós de assessoria em transações, a gente viu uma pausa inicial e, de repente, quando as pessoas entenderam a dinâmica da pandemia e os efeitos foram quantificados, principalmente o mercado de private equity voltou à tona com todo vapor. Eu diria que nos últimos 3, 4 meses, a gente certamente está operando em ritmo de pré-pandemia, e até passamos desse nível nos últimos dois meses em que os números de M&A buy side e sell side continuam aumentando, com uma perspectiva bastante interessante para 2021, que não está atrelado a M&A com viés de restruturação ou stress. O private equity no Brasil e o mundo corporativo estão vendo muita oportunidade no mercado. Estamos passando por um momento bastante interessante, onde vemos um nível de transações alto no mercado brasileiro e muitos projetos de buy e sell side, aliás, o maior número de diligências da nossa história esta acontecendo agora.

 

DM: Como você enxerga a sua empresa futuramente neste mercado?

FP: Focando na nossa área de assessoria em transações, eu acho que vamos ter um papel importante no mercado de M&A daqui para frente. Eu vejo a necessidade de uma diligência robusta, de qualidade e com tecnologia, além do básico, muito prevalente. Eu vejo a necessidade de uma combinação de “por a mão na massa” com alta tecnologia em que podemos chegar a conclusões de forma eficiente e adequada para a dinâmica de cada transação. Nossos clientes estão cada vez mais expandindo o escopo da diligência, cada vez mais se entra em aspectos operacionais, e cada vez mais demandam pontos de vista operacionais em fases de pré-deal, de pré-closing. Apesar de haver muita automação em diligência, isto não significa que não tenhamos entrado em maior nível de detalhes e colocado menos a mão na massa. Muito pelo contrário. Nós temos expandido nosso escopo desde compliance, tributário até aspectos de TI e operacionais para que os nossos clientes possam, cada vez mais, ter uma opinião mais apurada sobre as empresas antes de fechar uma transação.

 

Sobre Fábio Pires: Managing Director da Alvarez & Marsal na América Latina, no Grupo de Transaction Advisory. Com mais de 17 anos de experiência em transações, Fábio é especializado em liderar processos de diligência no buy e sell side, trabalhando para fundos de private equity e grandes corporações na região.

 

Sobre a Alvarez & Marsal: É uma empresa líder mundial em serviços profissionais notável por seu trabalho em reestruturação e melhoria de desempenho de empresas de grande porte, tanto nos Estados Unidos quanto América Latina, Europa e Ásia. Foi fundada em 1983 por Tony Alvarez II, ex-executivo da Coopers & Lybrand, e Bryan Marsal, ex-executivo do Citibank, após ambos terem juntos trabalhado na Norton Simon Inc.

 

Denis Salvador Morante
Senior Partner – Fortezza
Diligência em M&A, entrevista com Fábio Pires, Managing Director da Alvarez & Marsal no Brasil




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