logo fortezza
< Voltar

Conteúdos


Litígios e Arbitragem em M&A, entrevista com Vânia Wongtschowski, sócia fundadora do WZ Advogados



 

Litígios e Arbitragem em M&A, entrevista com Vânia Wongtschowski, sócia fundadora do WZ Advogados
Vânia Wongtschowski, sócia fundadora do WZ Advogados, conversou conosco sobre Litígios e Arbitragem em M&A, trazendo sua visão prática sobre o assunto. Você acompanha em detalhes o nosso bate-papo:
 
Denis Morante – Fortezza Partners: É muito comum haver litígios em transações de compra e venda de empresas? Quais as naturezas mais comuns destes conflitos?
Vânia Wongtschowski – WZ Advogados: Inicialmente trarei alguns dados sobre arbitragem no Brasil. Com relação à arbitragem, não há banco de dados como há na Justiça Comum. Não há, por exemplo, pesquisa que se possa fazer com os distribuidores forenses por conta da confidencialidade dos procedimentos arbitrais. Não é possível pesquisar os nomes das empresas, os assuntos, as partes, os contratos existentes que geraram as arbitragens. Mas existem alguns estudos que são feitos e que saem dentro da comunidade arbitral com alguns dados gerais. Para termos uma ideia, em pesquisa realizada em 2017, por exemplo, as arbitragens societárias representavam quase 35% do total das arbitragens da Câmara de Comércio Brasil Canadá, que é uma das principais do Brasil; 20% dos procedimentos da CAMARB e, 25% na Câmara de Arbitragem do Rio de Janeiro. Enfim, é um volume expressivo.
A Câmara Brasil Canadá divulgou recentemente o relatório do ano de 2019 e as arbitragens societárias passaram a representar 51% das matérias submetidas a arbitragem. O que mostra um aumento das disputas societárias no Brasil.
Atualmente, é muito raro um contrato de compra e venda de empresas não ter uma cláusula arbitral o que também colabora para o crescimento das arbitragens. Isto acaba gerando um aumento do volume de arbitragens.
No escritório, é perceptivo o grande volume de casos de disputas oriundas de contratos de compra e venda de empresas e outras discussões societárias. Normalmente, estas discussões advêm daqueles assuntos em que os advogados de ambos lados envolvidos em uma transação investem mais tempo para aprimorar as redações. Entre os principais assuntos que acabam gerando discussão podemos destacar:

  • Quebra de declarações e garantias por parte do vendedor. O vendedor faz uma declaração sobre a situação da empresa conforme as informações que ele possui naquele momento em que a declaração é prestada. E algo que sempre se discute, por exemplo, é o quanto se espera que o vendedor tenha conhecimento sobre todas as situações que ocorreram na empresa. Por exemplo, uma situação que não era de conhecimento dos vendedores e isto acaba sendo entendido pelos compradores como uma quebra de declarações e garantias;
  • Mudanças no cenário pós-fechamento. É o que estamos está vivendo agora, mudanças que estão relacionadas às situações adversas sem previsão e que acabam alterando a previsão de receita, as bases que foram utilizadas para a fixação do preço. Em alguns casos, ocorrem eventos pós-fechamento que geram um prejuízo para a empresa e há discussões sobre a validade ou não de indenização pelos vendedores aos compradores, se é perda ou não conforme os conceitos do contrato. Tudo o que acontece no pós-fechamento mas que tenha como fato gerador algo anterior à transação pode trazer discussão;
  • Materialização de contingência. Quando há uma escrow, há valores retidos para indenizar contingências e a discussão acaba se dando sobre o valor da materialização da contingência ou sobre impostos, ou seja, líquido ou bruto;
  • Ajuste de preço. Após a transação, é feito o balanço de abertura e é feito o ajuste de preço. Porém, como este ajuste ocorre logo após o início da relação, isto acaba sendo resolvido em negociações e não via arbitragens;
  • Passivos ocultos não declarados. Até que ponto os passivos não declarados deveriam ter sido informados e declarados. Ou se o comprador deveria ter identificado durante a sua diligência;
  • Earnout. Este assunto é muito comum, especialmente quando o vendedor vai receber o earnout e sai da gestão da empresa, ou seja, é colocar esta cláusula e a discussão acaba existindo lá na frente. Costuma dar muito problema. O vendedor nunca recebe aquilo que achava que receberia. Ao perder o poder decisório, o vendedor não tem poder sobre aquela parcela de preço a receber. Outro aspecto relacionado é haver previsão de compensação de earnout com contingências. Esta amarração costuma trazer muitos conflitos. Neste caso de earnout, há uma pesquisa de 2017 que indica que mais de 50% dos contratos de compra e venda que geraram arbitragens continham clausula de earnout, o que confirma o quanto o earnout traz problemas;
  • Quando a “empresa vendedora” declara que eles têm determinados contratos existentes e que vão gerar um determinado fluxo de caixa no futuro e eventualmente esses contratos não se concretizam, ai vemos o comprador querendo reaver o resultado;
  • Não competição. É muito incomum este assunto aparecer.

 
DM: Estes conflitos costumam ser de fácil ou difícil solução?
VW: O que é preciso entender é que a arbitragem é mais cara que a justiça comum, é um processo mais profundo do ponto de vista do trabalho e envolvimento das partes e acaba levando as partes a pensarem duas vezes antes de iniciarem um procedimento arbitral. Pela minha experiência, uma arbitragem nunca é simples então por mais que a gente tenha uma arbitragem para discutir uma única cláusula do contrato, ela nunca fica restrita àquela única discussão. Já que as partes estão ali discutindo acabam levantando todos os pontos daquele contrato. O que acaba acontecendo é que como na arbitragem, via de regra, há árbitros com muita experiência, são especialistas e que entendem muito do assunto e, eles acabam indo muito a fundo, então nunca é uma conversa superficial. Eu não diria que é de difícil solução porque você tem um contrato, mas é trabalhoso, vai a fundo e demanda das partes um esforço para realmente demonstrarem os seus direitos. Parece uma bola de neve, começa pequena e vai crescendo.
 
DM: Quanto tempo dura uma arbitragem? A média seria de uns dois anos mais ou menos?
VW: O tempo estimado de uma arbitragem, e que as Câmaras divulgam, é que ela pode durar entre 18 e 60 meses. E isso vai depender da complexidade do processo, pois você pode ter uma arbitragem que requer uma perícia, uma audiência para ouvir os peritos de ambas as partes, analisar as provas, etc. O tempo vai depender muito do assunto. Eu já presenciei uma arbitragem chegar a cinco anos, mas podemos dizer que dois anos é uma média ideal para que uma arbitragem seja resolvida.
 
DM: É mais comum o litígio se iniciar pelo comprador ou vendedor?
VW: Olhando para os casos que vemos muito no escritório e que temos como experiência, é mais comum o litígio se iniciar pelo comprador. É o comprador que geralmente quer discutir preço, indenização, possíveis quebras de declarações e garantias, alterações dos resultados esperados.
O vendedor normalmente inicia um litígio quando está relacionado à compensação de valores. E muitas vezes quem comprou e se vê em uma posição que tende a compensar a parte do preço com o prejuízo que teve e, aí vai caber a quem vendeu iniciar um processo para rever esses valores. Porém, a grande parte dos processos é iniciada pelo comprador.
 
DM: Historicamente, tem havido mais, menos ou sem variações em termos de quantidade de arbitragens?
VW: Temos alguns dados que mostram que entre 2016 e 2017 houve um crescimento de 37% no número de arbitragens em andamento nas Câmaras Arbitrais. E isso se explica pelo fato de termos tido um período de crise econômica, que se iniciou no ano de 2015, e, acabou revertendo neste crescimento. Depois continuou crescendo, porém ficou mais estável e a tendência é que nos próximos anos, por causa do momento em que estamos vivendo, ocorra um aumento no volume de arbitragens considerável para os próximos anos. Isto é natural pois o instituto da arbitragem saiu da adolescência e chegou à idade adulta. O que também é importante falar com relação a este aumento é que, durante muito tempo no Brasil, as partes (comprador e vendedor) duvidavam da eficácia da arbitragem, havia desconfiança, o Judiciário também era bastante reticente. E hoje esse cenário mudou. Temos um Judiciário muito pró-arbitragem, que inclusive vem validando as sentenças impostas, estão entendendo que não podem entrar no mérito das arbitragens e, isso traz mais credibilidade para o instituto. Além disso, as pessoas sentem-se mais à vontade, mais seguras em incluírem as cláusulas em seus contratos. Enfim, tem havido aumento, houve um boom entre 16 e 17 e a tendência é haver um aumento até pelo que estamos passando neste momento.
 
DM: Como os contratos, cada vez mais, preveem arbitragem, a Justiça comum tem sido menos utilizada. Hoje as empresas estão buscando mais a arbitragem do que a Justiça comum no âmbito societário e de compra e venda?
VW: No âmbito societário em geral temos que lembrar que a lei das S.A. foi alterada para permitir que as companhias abertas tenham cláusulas compromissórias nos seus estatutos social e, que todo mundo que vier a comprar os valores mobiliários dessa empresa, de alguma forma, fica vinculada à cláusula arbitral. Temos instruções da CVM prevendo que as companhias fechadas que são investidas por FIPs (Fundo de Investimento em Participações), necessariamente tem que ter cláusula compromissória e cláusula arbitral. Então está sendo mais comum, e, os próprios estatutos das companhias, sejam elas abertas ou fechadas, cada vez mais, as partes preveem arbitragem. E outros tipos de disputa societária também acabam sendo levadas para arbitragem por conta, justamente, da maturidade do instituto e de todas as questões que envolvam a compra e venda de uma empresa. E assim já a questão de compra e venda de empresas menores, negócios pequenos, provavelmente, não terão cláusula arbitral, mas os contatos maiores de empresas de médio e grande portes, pelo menos, o que acompanhamos no escritório, quase todas contém cláusula arbitral.
 
DM: Quando essa tendência começou?
VW: Em 2001 o STF declarou a constitucionalidade da Lei de Arbitragem, sendo esse o marco que permitiu que o instituto começasse a deslanchar. Só que para que a arbitragem exista é necessário dizer que as partes precisam incluir em contrato e preverem quais disputas podem vir a ser discutidas lá no futuro. Como comentei os dados de arbitragem estão crescendo ano após ano. Primeiro porque as pessoas estão entendendo que é um método confiável. E, segundo, porque hoje estamos em um estágio de maturidade da lei de arbitragem, da relação com o Poder Judiciário, o que permite que as partes tenham essa confiança.
 
DM: Qual impacto da participação de empresas e fundos estrangeiros nas transações do ponto de vista de litígios, ou seja, eles trazem mais ou menos arbitragens?
VW: As empresas e fundos estrangeiros nem discutem, eles sempre incluem a cláusula de arbitragem sem dúvida alguma. O que acontece é que os estrangeiros geralmente não querem se submeter ao Judiciário no Brasil. E é muito mais favorável ter uma corte em que eles possam incluir profissionais do seu País.
 
DM: Explique para nós as vantagens e desvantagens de se utilizar arbitragem e quais as principais fases, por favor?
VW: Uma arbitragem é dividida em quatro fases. Primeiro passo é o que chamamos de prévia, que é quando instituímos a arbitragem, o momento da intimação da outra parte, escolha dos árbitros e termina com a assinatura dos termos de arbitragem. Depois vamos para a parte postulatória, que é a fase de troca de manifestações. As partes entregam por escrito os seus pedidos. É uma fase densa de trabalho. A terceira fase é a que chamamos de instrutória, quando levantamos as provas, temos a audiência de apresentação dos casos e finalizamos com a apresentação das alegações finais. E, por último, a decisória, que é quando temos a sentença final e quando temos ainda os pedidos de esclarecimento até o encerramento do processo. O que podemos destacar como vantagem no processo de arbitragem é que você tem mais profundidade de cada caso do que na Justiça comum. O tempo também é um fator importante. Uma arbitragem pode levar até cinco anos enquanto na justiça comum, pode chegar a 10 anos. E você tem a previsibilidade. Já o que poderia destacar como uma desvantagem, talvez, seria com relação ao custo, mas isso para litígios menores. E a impossibilidade de se ter recurso.
 
DM: O escritório de vocês é focado em contencioso? Conte-nos um pouco.
VW: A WZ Advogados tem foco em contencioso, soluções de disputas, arbitragem, mediação, resolução de conflitos e área societária. Estamos tendo ótimos resultados na área de arbitragem e estamos, cada vez mais, dando atenção a isso, pois estamos nos destacando, ganhando bastante visibilidade. Outra área que estamos dando bastante atenção é com relação a disputas societárias.
 
DM: Quais impactos você enxerga que a pandemia e a consequente crise aguda econômica trarão para futuros litígios e arbitragens em transações?
VW: Acredito que sem dúvida alguma teremos um grande impacto. E também acredito que veremos muitas pessoas se aproveitando da situação para rever contratos e preços.  E isso é algo que já podemos sentir em litígios em geral por descumprimento e rescisão contratual. No escritório, trabalhamos com o setor de construção, por exemplo, e já vemos muita discussão com relação a prazos de entrega de obras. Já no setor de locação imobiliária também estamos sentindo o impacto com processos relacionados ao não pagamento de multa do aluguel, alegando a questão da pandemia. Esse tipo de ação tem uns dois meses que começamos a receber. E com relação à arbitragem ainda não, mas como esta área especificamente leva um pouco mais de tempo, acredito que o pico será mesmo em 2021.
 

Sobre Vânia Wongtschowski: Sócia fundadora do WZ Advogados e possui mais de 20 anos de experiência em grandes bancas no Brasil. É responsável pela condução do Contencioso Cível, que possui cerca de mil ações judiciais em andamento com clientes em diferentes setores da economia, bem como pela área Pró-Bono. Também atua na área de Arbitragem e, ainda, em diferentes resoluções de conflitos judiciais e extrajudiciais e disputas societárias, assim como na consultoria para prevenção e resolução de conflitos. Mestre em Direito Civil com ênfase em Contratos. Árbitra na Câmara de Arbitragem da OAB/SP. Membro do Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBAR). Conselheira Fiscal do Sistema B-Brasil.
 
Sobre o WZ Advogados: Escritório com 15 anos de atuação, especializado em solução de conflitos de alta complexidade (judiciais, arbitrais e mediações), bem como em sofisticadas operações societárias. Seus integrantes acreditam na parceria e no atendimento personalizado como condições indispensáveis para satisfazer seus clientes. É o primeiro escritório de advocacia no Brasil a ser certificado como Empresa B, o que significa que alcança os mais elevados padrões de governança e geração de impactos positivos em relação a colaboradores, comunidade e meio ambiente. Primeiro escritório do Brasil a ser Carbono Neutro.
 

Denis Salvador Morante
Senior Partner – Fortezza
Litígios e Arbitragem em M&A, entrevista com Vânia Wongtschowski, sócia fundadora do WZ Advogados




Atração de investidor financeiro ou venda para player estratégico?

Primeiramente, vale a pena um esclarecimento sobre as diferenças entre uma transação envolvendo investidores financeiros e es...

Aumento na competição por ativos e outras tendências que devem impulsionar M&As

O ano de 2023 foi marcado por uma transição política relevante no Brasil, acompanhada de uma moderada política monetária ex...

Deals de M&A cancelados: Os impactos para investidores e para as companhias

No mundo dinâmico das fusões e aquisições (M&A), as negociações podem ser tão voláteis quanto promissoras. Enquanto ...